Narciso (sentado no sofá cinza)

O elevador sempre demora quase uma eternidade para subir, ele sempre abre a porta e me deixa entrar primeiro. À frente, aquela cozinha tipo estilo americano, porta de salloon, um lustre de rua de pracinhas do interior, uma vista para outros apartamentos de estilo praiano, cama baixa, lençóis sempre jogados, uma coruja branca de pelúcia, roupas alinhadas, sangue no colchão, o sofá. Tão acostumada com espíritos pra lá e pra cá, velas acesas pelos cantos e algum incenso de alecrim no quarto, tudo ali me remete um silencio terrível, quase não dá pra enlouquecer. Ao mesmo tempo a tranqüilidade me faz querer um pouquinho daquilo todo dia, talvez não seja pelo lugar, seja por você.

"Te escrevo com um cigarro aceso e uma xícara de chá de boldo. A escrivaninha é muito antiga, daquelas que têm uma tampa, parece piano. Tem um pôster com Garcia Lorca na minha frente. Um retrato enorme de Virginia Woolf. E posso ver na estante assim, de repente, todo o Proust, e muito Rimbaud, e Verlaine, Faulkner, Ítalo Svevo, William Blake. Umas reproduções de Picasso. Outras de Da Vinci. Um biscuit com um pierrô tão patético. Uma pedra esotérica ainda de Stonehenge, Inglaterra, uma caixinha indiana. Todos os meus pedaços aqui.E você não me conhece, eu não conheço você."

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