Narciso (na mesa posta)
A meses planejava isso. As meses não, nunca conseguiu planejar e efetivar qualquer planejamento, não era do tipo que fazia essas coisas. A idéia havia surgido uma semana atrás, ganhou força e finalmente teve coragem de expor para a família. Sabia que de uma certa forma era loucura, mas havia abandonado quase toda sua vida, faculdade, trabalho e amores, o que havia mais a perder. “A família!!” – alguém falou da ponta da mesa. “Não é bem assim né, família a gente não se perde, ela é como uma jóia guardadinha naquelas caixinhas de madeira decoradas” – até riu internamente. Jóia?? Tudo bem, tinha que dar aquela amaciada, Deus iria perdoar.
“Só que, como de hábito, na cabeça (como que separada do mundo, movida por interiores taquicardias, adrenalinas, metabolismos) se passava uma coisa, e naquele ponto em que isso cruzava com o de fora, esse lugar onde habitamos outros, começava a região do incompreensível: Lá, onde qualquer delicadeza premeditada poderia soar estúpida como um seco: não. E soou, em plena mesa posta.”
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