Narciso (homem carnivoro)


Era a gente na sua cama, eu na sua frente, você tirando cartas e desenhos da sua ultima gaveta, com o violão na mão, tocando Los Hermanos , tentando me beijar, eu esquivando, eu sabia que “aquilo” nunca rolaria. Era por te ver amigo demais, era por não querer, era por te amar demais. A gente sabe o quanto machuca isso. E a gente sabia não tocar mais naquele ponto. Escondíamos com sorrisos, e personagens, e tanta coisa que a gente próprio se confundia. Éramos dois hiperativos, éramos doidos, e jogávamos RPG e tomávamos advertência e saíamos por aí sempre querendo mais. E nos controlávamos como dois bons moços, e ajudávamos as pessoas a atravessarem a rua. E trocavamos CDs de musica e eu achava pornografia neles, e escondia que sabia, gostava de guardar aquilo comigo. Era como se eu tivesse um segredo seu e guardasse comigo, como se um pedaçinho seu fosse meu pra sempre.

Só que uma hora a gente tem que libertar o que já se foi.

“Sentindo-me vagamente ridículo, e também um tanto cruel, repeti que: vivíamos um tempo de con¬fusão e que todas as normas vigentes estavam caindo que aos poucos também todas as pessoas aceitariam todas as coisas e que talvez nós fôssemos apenas alguns dos precursores dessa aceitação. Falei dessas coisas até cansar, enumerei nomes, contei lendas, lembrei mitos, mas não consegui evi¬tar seu olhar de fera provocando tremores e abismos no fundo de minha voz.”

Comentários

Postagens mais visitadas