Impala (em cima)

Eu tremia. Tremia pra cacete. Fui num lugarzinho qualquer comprar algo para comer e um café, café não, uma água, por favor. Enquanto comia, tremia pra cacete ainda. Cumprimento suave, eu pensei de repente. Às vezes me acho uma merda social, fico meio eufórica quando estou tímida, uso cordialidade, empolgação e umas palavras de periferia na mesma frase. Meus pés doíam de ficar parada, a única coisa que passaria era uma taça de champagne, mas recusei por formalidade. Em um desses corredores, tive um ataque de riso, que foi comprometido pela minha timidez em público, mas não evitou que eu sorrisse enquanto caminhava.

De longe dava para ver apenas o perfil do rosto. Pensei uma coisa estúpida, de uma conversa antiga, fiquei com dúvidas se alguma vez eu tive essa conversa.

Era engraçado eu reparar como um terno sob medida parecia com covinhas de bochecha.

Não sei porque ainda isso acontece com a gente, de se sentir adolescente e rir sozinho, pelo menos não sei até que idade você para de sentir essas cócegas no estômago.

Encostamos nossos braços umas 10 vezes, e cara, como é foda olhar pra você, porque no meu jeito de conversar, olhando pro horizonte, eu me forcei a olhar para você algumas dúzias de vezes, e nessas vezes que eu olhava no seu olho, era tão no seu olho e era você me olhando tão no olho. E me desconcertava tanto que eu virava para olhar o horizonte e esbarrava no seu braço, ou era você que se mexia também, não sei onde é invenção.

E no meio daquelas pessoas você ria e balançava a cabeça para trás e era quando eu te via e cruzava o olhar, eu tinha que sair dali, sabe, tinha que dar uma volta, rindo comigo mesmo, porque só podia estar errada. Estava tudo errado, saca?

Aí que tocava no rádio aquela música they spun a web for me, they spun a web for me

Odeio relato. Odeio fazer igual você, suas crônicas e seu modo de mostrar a realidade de uma observação. Odeio diários, quero dizer tudo nas entrelinhas, quero que você leia uma, cem vezes, até enxergar nossos fatos aqui. Ideia besta de nossos fatos. Quero escrever aqui tudo que aconteceu, sem parecer que aconteceu, porque não aconteceu nada. Quero que só você entenda, mas ao mesmo tempo não entenda, vai que é tudo tão ridículo da minha cabeça e eu me meta numa roubada. Não quero falar com você, não quero te mostrar isso, mentira, eu quero muito, muito, muito, quero que tenha sido real, mas não quero que seja uma crônica. Também não quero que seja real porque vai chegar nos finalmentes e eu odeio finais, são sempre uma bagunça, ninguém consegue guardar segredo nessa merda de mundo.



Não posso dizer que minha memória é suficiente. Mas ela embaralha fazendo a falta se tornar luz, se tornar beleza, falta da falta, saudade com brilho e contraste.

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